O cantor, compositor e instrumentista Jards Macalé morreu nesta segunda-feira, 17, aos 82 anos, no Rio de Janeiro. A confirmação foi feita por meio das redes sociais do artista, onde sua equipe informou que ele havia passado por uma cirurgia recentemente. A causa oficial da morte não foi divulgada, mas, segundo informações publicadas pelo portal g1, Macalé estava internado para tratar um enfisema pulmonar e sofreu uma parada cardíaca.
No comunicado publicado no Instagram, a despedida veio com a delicadeza e o humor que sempre marcaram a trajetória do músico:
“Jards Macalé nos deixou hoje. Chegou a acordar de uma cirurgia cantando ‘Meu Nome é Gal’, com toda a energia e bom humor que sempre teve. Cante, cante, cante. É assim que sempre lembraremos do nosso mestre, professor e farol de liberdade.”
A nota agradece ainda o carinho dos admiradores e informa que detalhes sobre o funeral serão divulgados posteriormente. O texto termina com uma frase que o próprio Macalé costumava repetir: “Nessa soma de todas as coisas, o que sobra é a arte. Eu não quero mais ser moderno, quero ser eterno.”
Uma carreira marcada pela invenção
Jards Macalé foi uma das figuras mais singulares da MPB. Nascido e criado no Rio de Janeiro, mergulhou, nos anos 1960, no estudo de teoria musical e violão erudito, aproximando-se de mestres como o maestro Guerra-Peixe. Frequentador ativo dos ambientes boêmios e culturais da cidade, conviveu desde cedo com músicos, poetas e artistas que moldaram seu olhar estético e abriram caminho para a experimentação que se tornaria sua marca registrada.
Nesse período inicial, Macalé se conectou a nomes fundamentais da contracultura brasileira, como Torquato Neto e Waly Salomão — este último seu parceiro mais constante e presença decisiva em sua obra.
Parcerias históricas
A influência de Macalé se espalhou por algumas das páginas mais importantes da música brasileira. Ele foi o diretor musical de Transa (1972), um dos discos mais emblemáticos de Caetano Veloso, gravado durante o exílio do baiano em Londres. Além da direção, Macalé também tocou violão no álbum.
No mesmo período, sua obra ganhou projeção na voz de Gal Costa. No histórico show Fa-tal (1971), a cantora lançou três composições que se tornariam clássicos: Vapor Barato e Mal Secreto, ambas em parceria com Waly Salomão, e Hotel das Estrelas, escrita com Duda Machado. As canções entraram definitivamente para o repertório da música brasileira e continuam sendo regravadas até hoje.
Obra autoral e reinvenção
Em 1972, Macalé lançou o disco que leva seu nome e que se tornaria o mais emblemático de sua carreira. Além das faixas já conhecidas pelo público, o álbum trouxe parcerias com Capinam, como Farinha do Desprezo e Movimento dos Barcos. Apesar de sua trajetória como intérprete, Macalé dizia com frequência que nunca quis ser cantor — e que só cedeu à ideia graças à insistência de Waly Salomão. “Ele me encheu o saco”, costumava brincar.
Dois anos depois, lançou Aprender a Nadar (1974), com destaque para Anjo Exterminado, também escrita com Salomão. A letra fazia humor com a fama de “poetas malditos” atribuída à dupla, em versos como: “Moço solitário, poeta benquisto.”
Um legado eterno
Jards Macalé deixa uma obra vasta, inquieta e profundamente inventiva — um percurso que atravessa a MPB, o samba, a poesia marginal, a contracultura e as vanguardas musicais. Ícone de liberdade artística e experimentação, manteve-se ativo por décadas, sempre disposto a romper fronteiras estéticas e a dialogar com novas gerações.
Sua música, como ele próprio desejava, permanece eterna.

Sem comentários:
Enviar um comentário